CRÓNICAS E ENTREVISTAS

 TANCOS NO LIVRO DOS FALHANÇOS HEROICOS
Publicado em: 12/09/2018
A fuga dos presos de Alcoentre figura no "The Book of Heroic Failures". Agora Tancos pode voltar a catapultar Portugal para este compêndio dos grandes fracassos da História. O ministro da Defesa faz por isso.

Rui Rio voltou este fim de semana a trazer à baila o assunto de Tancos. Não que tivesse desaparecido, porque uma história tão mal contada e burlesca tem o condão de voltar sempre ao de cima. Nem que seja evocando irresistivelmente a guerra do Solnado.

O nosso extraordinário ministro da Defesa reagiu com uma prontidão admirável: não num comunicado oficial, nem tão-pouco com uma conferência de Imprensa, mas nas páginas do Facebook, que tristemente os políticos confundem como um hemiciclo parlamentar.

Mas também ali a coisa não lhe correu bem, vendo as coisas pelos critérios de Mark Zuckerberg, que são certamente aqueles pelos quais ambicionava ser avaliado. Ou seja, mais de vinte e quatro horas depois, o "post" ostentava uns míseros 73 likes e 23 comentários, o que no mundo virtual equivale à morte do artista. De facto, não vale tudo.

Contudo, não estou aqui para dar más notícias, muito pelo contrário. A verdade é que venho anunciar que a novela de Tancos é uma oportunidade para Portugal, que tanto gostamos de ver brilhar entre os maiores da Europa, quiçá do mundo.

Passo a explicar: em 1979, Stephen Pile, publicou "The Book of Heroic Failures" (O Livro dos Fracassos Heroicos), que rapidamente se tornou best-seller, sucessivamente atualizado. O autor decidiu que era tempo de falar de insucessos grandiosos porque, afinal, a incompetência é aquilo que distingue os humanos dos outros animais. Ora, nesta bíblia das maiores barracas de sempre, podemos orgulhar-nos de ter duas páginas dedicadas aos "Piores Guardas Prisionais", em que se relata o desaparecimento de 124 pides de Alcoentre, a maior fuga em simultâneo de uma prisão de alta segurança. Ora, agora podemos ambicionar acrescentar-lhe mais duas.

E dito isto passo a citar, facilitando a tarefa de encontrar semelhanças com o que aconteceu recentemente no paiol militar. Diz assim:

"Durante as semanas que antecederam a fuga em Julho de 1978, os guardas prisionais notaram que eram cada vez menos a frequentar as sessões de cinema (onde passou 'A Grande Evasão'), e também deram pelo desaparecimento de 220 facas e de uma enorme quantidade de cabos elétricos. Um guarda explicou: 'Sim, é claro que planeávamos procurá-las, mas acabámos por nunca o fazer.'" Contudo, os guardas não tinham dado pelo enorme buraco na parede, porque estava "coberto com posters". Nem detetaram as grandes quantidades de pás, picaretas, mangueiras de pressão e martelos pneumáticos escondidos pelos detidos. A noite anterior à fuga um dos guardas reparou que dos 36 prisioneiros na sua ala, apenas 13 estavam presentes. Reportou que isto era "normal" porque os prisioneiros frequentemente faltavam à chamada ou escondiam-se, mas habitualmente surgiam na manhã seguinte.

"Só descobrimos que tinham escapado às 6h30 da manhã seguinte, quando um dos prisioneiros nos contou o que acontecera", disse mais tarde um dos guardas. Os holofotes foram classificados "como os nossos piores inimigos", porque estavam posicionados de forma a encadear os guardas, tornando impossível ver o que se passava nos muros exteriores. Quando finalmente contaram os presos que restavam, concluíram que metade desaparecera. Numa tentativa de explicação o ministro da Justiça, Dr. Santos Pais, declarou que a fuga era "normal", parte "do legítimo desejo dos prisioneiros de recuperar a liberdade".

Aqui para nós, estou certa de que Santos Pais não levará a mal que Azeredo Lopes lhe plagie o discurso para recordar aos portugueses que, afinal, as armas fugiram apenas para cumprir o desígnio para o qual foram criadas.