CRÓNICAS E ENTREVISTAS

 “CELEBRAR AS TAXAS DE NATALIDADE BAIXAS”
Publicado em: 17/07/2019
E enquanto o The Great Decrease fala em diminuir para que a abundância chegue para todos, os nossos grandes líderes asseguram-nos que já estão a pôr a primeira pedra das novas creches, onde os alegres novos pais podem deixar por mais tempo as suas menos alegres crianças.

Abri os olhos de espanto perante o gigantesco cartaz frente à Praia das Maçãs, em Sintra, que diz "CELEBRATE LOW BIRTH RATES" (Celebre as taxas de natalidade baixas), tudo em maiúsculas, preto no branco, em letras garrafais. A um canto, como que à sombra de uma onda decrescente de natalidade, a assinatura é apenas "The Great Decrease"[*]. Do outro lado da estrada, passeiam-se impávidas as famílias com crianças de balde na mão, aquelas que a campanha não quer ver multiplicadas.

Graças à internet móvel, quando me sento na areia já sei quem são os autores. Uma organização holandesa, que pretende lutar contra a superpopulação do planeta. Cito: "Tornámo-nos numerosos. A nossa espécie mais do que duplicou nos últimos 50 anos. Hoje mais de 7.6 biliões de pessoas vivem na Terra, e as Nações Unidas preveem que em 2050 mais de 10 biliões de humanos populem o planeta."

Posto isto, consideram a quebra da taxa de natalidade uma bênção. E para dar visibilidade aos bons povos que acataram destemidamente este desígnio de solidariedade e bom senso, premeiam-nos com uma campanha internacional.

Passam a nomear os três países que subiram ao pódio, e ali está Portugal em primeiro lugar, com uma invejável taxa de natalidade de 1.2, a mais baixa do mundo, seguido de Singapura (1.3) e da Holanda (1.6). E pedem-nos que celebremos o feito. Que a festa se faça ali à beira-mar, de cerveja na mão, mas certamente com os métodos contracetivos adequados, não vá o álcool e a maresia acordar a libido, roubando-nos também o título de quinto país mais envelhecido do mundo.

Infelizmente nem António Costa, nem Rui Rio, que também não vão para novos, foram a banhos à Praia das Maçãs, porque se o tivessem feito teriam entendido quão pouco oportuna era iniciarem a campanha eleitoral a saudar a subida da taxa de natalidade para 1.4 (dados de 2018), e a congratularem-se pelo efeito das suas políticas nesta ascensão meteórica de duas décimas. Muito menos batendo palmas a um povo que, afinal, mal se viu com mais uns euros no bolso, recusou o desígnio que nos havia sido acometido, obsoleto que estava o de dar novos mundos ao mundo.

Pior, muito pior, desdobraram-se em promessas e anúncio de medidas que pretendem levar-nos na direção diametralmente oposta, na triste ideia de que devemos multiplicar as criaturas que um dia nos irão pagar as pensões e garantir a sustentabilidade da Segurança Social, e já agora o Serviço Nacional de Saúde e tudo o resto.

E enquanto o The Great Decrease fala em diminuir para que a abundância chegue para todos, os nossos grandes líderes asseguram-nos que já estão a pôr a primeira pedra das novas creches, onde os alegres novos pais podem deixar por mais tempo as suas menos alegres crianças para trabalharem mais horas, para ficarem mais ricos e poderem então ter mais filhos.

Mas que não se enervem os senhores do The Great Decrease, porque não há qualquer risco da promessa se cumprir. Já em 2007, o eng. Sócrates também jurava que não saía do poder sem ter as criancinhas devidamente abrigadas em creches a preços mais baixos do que as propinas de uma universidade em Paris, e basta consultar a Pordata para perceber onde é que esse sonho vai.

Por outras palavras, por favor não tirem já o cartaz, porque o revés do 1.4 será rapidamente ultrapassado e recuperaremos gloriosamente a liderança do campeonato dos inférteis. E quanto aos indignados que veem este apelo à baixa da natalidade como uma ameaça às suas reformas, tenham calma, porque assim como assim já não as iam receber. E façam as contas, porque com o que filhos e netos custam às suas poupanças, quantos menos tiverem, mais fica para o que der e vier.

(*)https://www.thegreatdecrease.com