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JUL
20
 
 “SER AVÓ É SER MÃE DUAS VEZES”, ENTREVISTA A ISABEL STILWELL
A Isabel é avó há quanto tempo? Que idades têm e como se chamam os seus netos?

Fui avó pela primeira vez em 2010, de gémeas, o que é o jackpot das avós, como costumo dizer. A Carminho e a Madalena têm agora quase oito anos. Por ordem de idades, segue-se depois a Constança, com 6 anos, o Henrique e a Teresa, com 4 anos, a Marta, que fez 3 anos, e dois bebés, a Luísa, que fará um ano em Setembro e o Eduardo, com seis meses, o único rapaz para este clã de raparigas.

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“Ser avó é ser mãe duas vezes” já diz a nossa tradição popular… esta frase faz algum sentido e, se sim, porquê?

Hum, sim e não. Sim, no sentido de que é um amor, uma paixão, que nos é familiar, amamo-los apaixonadamente e tornam-se o centro da nossa vida, alegramo-nos e sofremos com tudo o que lhes acontece. Mas não, porque não somos os responsáveis últimos pela sua educação, pela sua vida e isso faz toda a diferença, somos acima de tudo retaguarda. E quanto melhor soubermos aceitar este papel, mais de apoio do que de intervenção, melhor para todos.

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As avós também têm dúvidas ou sabem tudo? Que dúvidas podem surgir como avó que se calhar não surgiram como mãe?

Como todos os pais depressa descobrem, toda a gente se acha perita em crianças e educação, e o que não falta são comentadores de bancada. Os avós incluídos. Mas se forem honestos vão ter muitas dúvidas, porque independentemente dos avanços da ciência (deitar virado para cima… cumpro sempre, mas custa-me!), e da segurança (fico furiosa com aqueles velhos do Restelo que dizem que no tempo deles não precisavam de cadeirinhas no carro, esquecendo todas as crianças que morreram em acidentes, para além de que hoje há mais carros e anda-se muito mais depressa), educar uma criança no século XX ou XXI não é a mesma coisa. Dar de mamar, sestas, horas de ir para a cama, alimentação, verdades e manias, como lidar com a dependência do telemóvel (a minha e a deles) e por ai adiante.

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Uma coisa que alguns pais se queixam é da intromissão que por vezes as mães/sogras fazem sobre as suas decisões ou forma como cuidam dos bebés. Porque acha que isto acontece?

Às vezes porque são chatas, ponto final, mas na maior parte dos casos porque adoram os filhos e os netos, e querem muito ajudar e acreditam que o sabem fazer. Esquecem-se, no entanto, que as filhas e as noras estão num tsunami de hormonas, inseguras, e sentem muitas vezes cada palavra como uma crítica. Como se estivesse subjacente um julgamento da forma como são mães. Por seu lado, as filhas e as noras esquecem que tudo o que as avós querem é sentir-se um bocadinho relevantes na vida daquela criança que é tão central na sua vida. A solução está na generosidade e no sentido de humor. A avó diz que o menino está muito magrinho, ou que tem olheiras porque não dorme? Responda-lhe que é das saudades da avó! E, se conseguir, depois deixo-lhe umas horas. Ela percebe que se esqueceu de que adormecer um bebé não é tão fácil como nostalgicamente imagina, e a mãe aproveita para ir fazer qualquer coisa sem o bebé, o que só lhe pode fazer bem.

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É difícil para as avós aceitarem uma forma de ser mãe/pai diferente daquela que tiveram quando foram elas próprias mães? É como se os filhos estivessem a não concordar com a maneira como elas os criaram?

Acho que os avós têm consciência de que não fizeram tudo bem com os seus filhos, que nem sempre acertaram, que gostariam de ter feito de outra maneira. Muitas vezes sentem-se até culpados por não terem tido o tempo que queriam. E a verdade é que, falo por mim, sinto que a forma como os meus filhos, noras e genros são pais é, em muitos aspetos, melhor do que a minha foi. Mas, dito isto, há valores que não passam de moda, e os avós podem sentir que estão a fazer falta aos seus netos, e nesse sentido acho que devem ser capazes de confrontar os seus filhos com isso. Conversar diretamente com os pais das crianças, e não por “bocas”, e dizer-lhes, por exemplo, que sente que é importante que os netos sejam estimulados a dizer mais obrigados e se faz favores; que do seu ponto de vista é importante que fiquem sentados à mesa durante toda a refeição, ou pelo contrário, que lhe parece exagerada a disciplina que impõem às crianças tão pequenas e por aí adiante. O Eduardo Sá costuma dizer que os pais não devem desistir de educar os filhos, mesmo quando eles já são adultos.

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Sabemos que algumas avós acham estranho os filhos recorrerem à ajuda de locais como o Centro do Bebé… Dizem “no meu tempo não havia nada disto”, quase como se os pais devessem descobrir e decidir tudo por sua conta. Mas por outro lado, sentimos que, ao apoiarmos o casal a descobrir a sua forma de serem pais e mães, os conflitos familiares reduzem também bastante e envolvemos muito os avós neste círculo de confiança. Temos muitos avós a frequentar o Centro do Bebé, a virem à nossa preparação para o nascimento com as filhas quando o pai não está ou às consultas de sono com os bebés ou ao curso de primeiros socorros e ao workshop dos avós. Este caminho de descobertas pode ser partilhado? É possível os avós também descobrirem coisas novas que eram diferentes quando foram pais? Acha que quando se consegue abertura para isto, é possível todos participarem na chegada do bebé com confiança e respeitando o caminho de cada um?

Em primeiro lugar parabéns, acho que incluírem os avós nas vossas ações é brilhante, e certamente que contribui muitíssimo para que a vida do novo bebé comece com o pé direito. Ele é a principal vítima dos conflitos familiares, e tenho a certeza de que se estes assuntos forem debatidos, ainda por cima com um “moderador” externo, perdem toda a carga emocional negativa que tantas vezes lhe está associada. Porque, convenhamos, não são os legumes, ou as horas das mamadas, ou a forma de dar o banho em si que importa, o que mina as relações é o não dito, aquilo que se imagina que está por detrás desses gestos. Os avós estão numa etapa de envelhecimento, muitas vezes sentem-se postos de parte pelo mundo profissional, etc, e uma palavra dos filhos pode ser sentida como um atestado de irrelevância que desestabiliza muito mais do que era suposto, e de mal entendido em mal entendido… Por isso boa!

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Nós achamos que a ajuda dos avós no pós-parto e ao longo do crescimento dos netos é fundamental. Quais foram as ajudas que deu e que sentiu que foram mais importantes nas várias etapas?

Tenho consciência de que ajudei mais os que moram mais perto de mim, do que aqueles que vivem mais longe, mas diria que a maior ajuda que os avós podem dar é estar disponíveis naquilo que os pais lhes pedem. O que pode ser, por exemplo, ir ao supermercado, engomar a roupa, mesmo sabendo que talvez preferissem dar banho ou vestir e despir o bebé JFoi o que tentei fazer quando eles eram pequeninos. Como a minha maior dor enquanto mãe foi a carência de sono, ofereci-me para ficar com os meus netos enquanto a mãe e o pai dormiam, embora quando os bebés mamam torna-se tudo mais difícil. À medida que crescem, acho que a maior ajuda é estar disponível para os ir buscar à escola quando é preciso, para entrar em cena numa urgência, para ficar com eles uns dias porque os pais têm de trabalhar, ou merecem descansar. Mas sei que há avós que fazem muito, mas muito mais do que tudo isto.

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Já escreveu várias vezes sobre o que é ser avó e sobre os seus netos… São uma fonte de inspiração?

Uma fonte de inspiração constante. Graças a eles faço uma crónica mensal na revista Pais, vinda da antiga Pais e Filhos (que resultou da minha inspiração enquanto mãe), o livro “Diário de uma Avó Galinha”, dois livros de histórias para os avós contarem aos netos, e agora “O Frasco das Memórias”, com ideias para avós e netos fazerem juntos.

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Quase todos nós nos lembramos das coisas que fazíamos só com as nossas avós. É tão importante esse património de actividades conjuntas… Este novo livro quer dar muitas ideias aos avós?

Eu não tenho muitas memórias como neta, mas inspirei-me no exemplo da minha mãe enquanto avó, e das minhas três irmãs que são as melhores avós do mundo. Estas ideias foram nascendo ao longo destes oito anos, muitas delas nasceram de acasos, outras da repetição de experiências da minha infância. Contou com a colaboração direta da Madalena e da Carminho, e como digo foi testada em crianças de carne e osso. São as nossas memórias, e o importante é que os avós “fabriquem” as suas com os seus netos e encham um grande frasco com elas. Porque o coração, esse fica logo cheio.

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Conhece a visão que o Centro do Bebé tem sobre os bebés e as famílias? Gostava de nos dar o seu feedback sobre este nosso trabalho e uma mensagem para as famílias do Centro do Bebé?

Felizmente já não preciso de conselho sobre o sono dos meus filhos, mas gosto muito da abordagem do Centro e do olhar meigo da Constança para os bebés e para as suas famílias. Às pessoas que frequentam o Centro só posso dizer que estão em ótimas mãos com a fada dos bebés.

Obrigado!