BIOGRAFIA
•
LIVROS
•
PRESS
•
ALBUNS
•
AGENDA
•
DIAS DO AVESSO
•
CRÓNICAS E ENTREVISTAS
•
CONTACTOS
CRÓNICAS E ENTREVISTAS
VER TELEVISÃO SEM CULPA
Publicado em: 24/06/2025
Ai, meu Deus, já sei que vocês, filhos, filhas, noras e genros, se vão atirar a mim, afogando-me em estudos sob o efeito da dopamina ou outra substância qualquer nos cérebros imaturos dos meus netos.
Ana, é tempo de reabilitar a televisão.
Espera, não te impacientes — durante uma viagem a S. Tomé e Príncipe, o guia disse-me que a natalidade decrescera muito nas vilas onde havia um televisor na praça, porque os homens entretinham-se a ver os jogos de futebol, para sossego das esposas já com uma ninhada de filhos em casa. Aliás, de tal forma é famoso o seu efeito contracetivo que até temo que Trump, por estes dias, decida aproveitar para abolir todas as cadeias de televisão, à exceção da Fox, claro, alegando a necessidade de incentivar a procriação de americanos puros.
Adiante, o que te queria dizer é que é tempo de reabilitar a televisão (não disse o telemóvel, não confundas!) para as crianças pequeninas. Ai, meu Deus, já sei que a partir desta carta vocês todos, filhos, filhas, noras e genros, se vão atirar a mim, afogando-me em estudos sobre o efeito da dopamina ou outra substância qualquer nos cérebros imaturos dos meus netos, mas poupem o esforço porque não vou mudar de opinião. Quando já lemos um livro, fizemos torres de cubos, vestimos e despimos bonecas, demos vida a marionetas, brincámos com água e ainda falta uma hora para a hora do banho e do jantar, desculpem, mas tanto a avó como a criança merecem sentar-se no sofá aconchegadinhos a ver a Bluey ou a nossa série preferida. No outro dia, comecei a ver o novo filme da Cinderela com a tua M. até que a vieste buscar, e depois continuei a vê-lo sozinha, e tirei mais uma vez o chapéu à Disney.
Espera, não me digas, por favor, que é preciso que seja um documentário ou um programa didático, porque a experiência que fiz nessa linha com uma das tuas sobrinhas mais pequeninas, exatamente numa tentativa de atenuar o meu pecado, revelou-se aterrador. Sintonizei no Wild da National Geographic e aquilo é mais violento do que o “Exterminador Implacável” do Schwarzenegger, com leoas a devorar pobres bambis, e chitas a estafarem infelizes zebras até que as apanhavam e as desfaziam em pedaços, uma experiência para maiores de 18 anos no mínimo.
Pronto, agora que desabafei e pus tudo em pratos limpos, sinto-me muito mais descansada. Detesto segredos, mas se resistires, não contes a ninguém.
***
Querida Mãe,
Escreveu à pessoa errada se estava à espera que rebatesse os seus argumentos! Sou uma enorme fã da televisão há muitos anos, aliás, desde que depois de muitas noites mal dormidas, descobri que quando as gémeas queriam começar o dia às 6 da manhã, aguentavam mais 30 minutos sossegadas se postas em frente do ecrã. Nem sequer vai conseguir que defenda só os conteúdos pedagógicos, porque esse sermão serve apenas para pais de primeiros filhos, já que pelo segundo, ou terceiro, são os irmãos mais velhos que decidem o que ver e o mais novo vai de arrasto, saltando a fase do BabyTV diretamente para o canal da Disney.
Aliás, tenho memórias muito felizes de estar com os primos a ver os Jogos sem Fronteiras. Dos nossos jantares juntos no sofá a ver o Médico de Família. Das séries que me fazem companhia e de rever todos os filmes da Disney com os meus filhos. Também tenho ótimas memórias de poder cozinhar sossegada ou de conseguir ler um pouco, enquanto me sento ao lado do mais novo e ele vê qualquer coisa na televisão.
Por isso, mãe, se procurava absolvição para o seu suposto pecado, está mais do que perdoada. Mas nem eu, nem a mãe, seguramente, defendemos a ideia de “bar aberto” numa altura em que há desenhos animados 24 horas por dia, ao contrário do tempo em que os desenhos animados só aconteciam em tempo real e num horário fixo. Para os dias de hoje, deixo estas sugestões:
#1 Ter apenas uma televisão em casa! Dá discussões e birras? É claro que sim, mas afinam a capacidade de argumentação e tornam o ver televisão num programa partilhado.
#2 Pensar no que a televisão está a substituir. O tempo visto está equilibrado com tempo na rua, brincadeira, socialização, etc.? Se sim, sem problema.
#3 Tentar ir integrando filmes inteiros, que têm princípio, meio e fim, que complexificam o raciocínio, e não apenas episódios rápidos.
#4 Ou estão no telemóvel ou estão a ver televisão, não as duas coisas ao mesmo tempo.
#5 Se os queremos arrancar da televisão com sucesso, sugiro que comecemos uma brincadeira ou um jogo com eles, ficando disponíveis para eles durante os primeiros dez minutos. Surpreende-me sempre como ficam depois sozinhos a brincar, desde que me envolva com eles no início.
Beijinhos!
Siga no Instagram: https://www.instagram.com/birrasdemae/
Siga no Facebook: https://www.facebook.com/birrasdemae/
Leia no site do Público »