CRÓNICAS E ENTREVISTAS

 HOJE ACORDEI COM VONTADE DE VOS TER SÓ PARA MIM
Publicado em: 01/07/2025
Estou com tantas saudades que nem me importava de vos ouvir troçar de mim, daquela maneira que, em dose moderada, me ajuda a conhecer-me melhor a mim mesma.


Querida Ana,

Esta carta não é uma carta, é uma convocatória: apresenta-te, com a tua irmã, em minha casa já! Mas sem maridos, os meus queridos genros, e sem filhos, os meus queridos netos. Por uma vez, quero-vos só para mim. Quero ouvir as vossas histórias e contar-vos as minhas, e há mil assuntos para os quais preciso da vossa opinião (sim, desde o que vestir no casamento de sábado, até o que pensam da política internacional). Estou com tantas saudades que nem me importava de vos ouvir troçar de mim, daquela maneira que, em dose moderada, me ajuda a conhecer-me melhor a mim mesma. E a achar-vos tanta graça, que me rio, mesmo que à minha custa.

Assusta-me um bocadinho esta súbita necessidade da vossa companhia e atenção exclusiva, porque me parece coisa já de velhinha egocêntrica, e temo que se intensifique com o tempo. Se me começar a choramingar que nunca me visitam, desliguem o telefone sem cerimónia, por favor.

Nunca fui uma mãe-galinha no sentido de precisar que os meus filhos andem à minha volta, por regra até fico muito mais contente quando sei que estão felizes e lá na vossa vida. Aliás, se for absolutamente sincera, até é a minha modalidade preferida, porque como preciso de ver toda a gente bem em simultâneo, quando vocês estão todos por perto começo a focar-me naquele que está triste ou preocupado, e a ficar ansiosa.

Pois, mas hoje acordei com vontade de vos ter só para mim. Não por serem minhas filhas, mas por serem as minhas pessoas favoritas.

Contem com duas horas, e venham com paciência para ver álbuns e desfiar memórias. Suspeito que depois desse tempo, já estarei desejosa de vos ver pelas costas.

Beijinhos

***

Querida Mãe,

Vou já avisar o meu marido e fazer as malas!

Na verdade, temos muita sorte porque gostamos genuinamente da companhia uns dos outros. Acredita que esta semana estava a pensar em convidar uns novos amigos para virem jantar cá a casa e o meu primeiro instinto foi “Ah, quero tanto que a minha mãe os conheça!”? Tomei consciência de que aos quase 39 anos, ainda me apetece apresentar os meus amigos aos meus pais. E isto fez-me pensar que, de facto, nunca passei pela fase da vergonha da família que é típica da adolescência, e que talvez seja por isso que a mãe nunca se sentiu mãe-galinha, não precisava de fazer nada para que quiséssemos andar à sua volta, porque nós queríamos estar à sua volta, com os seus amigos, com os tios e primos. Era como se muitos dos meus amigos tivessem de escolher entre o entusiasmo das coisas “lá de fora” e o conforto da família, e nós tivéssemos um dois em um!

Em relação ao seu problema de nos ter que ver sempre bem, sim, confirmo a patologia, que vem da sua empatia deslocada (sim, não me esqueço que cunhou o termo), mas também se não tivesse defeitos e peculiaridades próprias, que material usávamos para fazer troça de si?

Em relação aos álbuns, por favor, mãe, por favor, deixe-mos em herança, é a única coisa que quero! Já que não me passou nos genes a paciência para imprimir fotografias e colá-las em livros de memórias, passa-me diretamente a sua “obra”, pode ser?

Beijinhos e até já.


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