CRÓNICAS E ENTREVISTAS

 COMO EDUCAR COM CONEXÃO E RESPEITO
Publicado em: 13/11/2025
Ao contrário do que dizem os velhos do Restelo, o que vejo é mais adultos agirem com respeito para com os miúdos, exatamente porque já foram tratados desta forma e gostaram, e perceberam que resultou.



Querida Mãe,

Eu sei que há uma ideia generalizada de que esta nova geração é muito mais “frágil” e sensível, do que aquelas que a precederam. Que muitas pessoas acreditam que antigamente andavam todos mais a “toque de caixa”, o que tinha a vantagem de que algumas coisas pareciam funcionar de forma mais eficaz e mais rápida, mais compatível com o tempo dos adultos.

Consigo perceber os argumentos, porque é sempre mais fácil para um professor, um médico, um cabeleireiro, lidar com uma criança que “faz e pronto”, obedece sem protestos, do que aquela que tem espaço para mostrar o seu medo, as suas hesitações, que diz que não quer, ou que não está interessada. Que não está 100% disponível para corresponder a todas as expectativas dos adultos sem as questionar.

A verdade é que dá muito mais trabalho criar uma conexão com a criança que permita que esta queria fazer parte da solução do que domá-la pelo medo, dá muito mais trabalho ir buscar o interesse da criança e trabalhar a partir daí. E muitos podem alegar que não compensa (porque há tanta matéria para dar, porque é preciso prepará-los para o mundo “lá fora”, onde ninguém vai ter essa paciência) mas, querida Mãe, estou sentada a ver a minha filha hipersensível a submeter-se e a colaborar num procedimento no dentista — que lhe metia tanto medo que nem dormiu —, e a ser tão apoiada, tão respeitada e tão valorizada no seu esforço, que o amor e a dedicação que sinto nesta sala leva-me a ter a certeza de que este caminho, mesmo sendo mais complicado, vale mesmo a pena. Acho que saímos todos a ganhar.

E sabe, Mãe, ao contrário do que dizem os velhos do Restelo, o que vejo é cada vez mais adultos agirem com este respeito para com os miúdos, exatamente porque já foram tratados desta forma, e gostaram, e perceberam que resultou. Não estão a seguir um guião (oh, os miúdos cheiram essa falsidade em três minutos), mas porque também sentiram, algures na sua vida, que não é preciso usar o medo para ter influência. Sim, demora mais tempo e obriga a desacelerar, mas não será exatamente disso que andamos todos a precisar? É que não me parece que o ritmo a que vamos esteja a funcionar muito bem!


***


Querida Ana,

Gosto do teu otimismo, e acredito muito mais nas tuas observações do que na ladainha catastrófica de uma geração perdida, a próxima sempre pior do que a anterior, desde o princípio dos tempos. Venham daí os novos profissionais, que além de uma formação exigente, querem lidar com os seus alunos/doentes/clientes com a mesma empatia com que foram tratados.

Faz todo o sentido que repliquem as boas práticas de que foram alvo, num ciclo virtuoso! Afinal se acreditarmos, como acredito, que o exemplo é a espinha dorsal da educação e da transmissão de valores, então é mais do que desejável que décadas de democracia e um conhecimento crescente do desenvolvimento e da psicologia infantil, tenham produzido adultos capazes de tratar as crianças com muito mais respeito.

Dito isto, deixa-me agora fazer de advogada do diabo, ou seja, de avó: ainda vejo muitos pais a educarem pelo medo, o que me provoca uma raiva visceral, mas já não me parece nada mal que as crianças cresçam a perceber que há decisões que não podem ser negociadas, que há situações em que as “ordens” devem ser seguidas sem discussão, mesmo que mais tarde possam ser postas em cima da mesa para debate, e que estejam conscientes de que, infelizmente, há obstáculos que não podem ser contornados e em que o “tem de ser, tem muita força”. Parece-me, até, que ganham em segurança e serenidade se confiarem que os pais (e os adultos em que os pais confiam) decidem no seu melhor interesse — mesmo que não se dispensem de protestar, como faz parte!



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