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CRÓNICAS E ENTREVISTAS
PORQUE TER IRMÃOS DEVIA CONSTAR DOS CV - DN
Publicado em: 27/05/2018
Os chefes inteligentes deviam contratar empregados com irmãos. Já vêm com todas as "formações" e work-shops incluídos. Melhor, só quem apresenta um doutoramento em mãe de irmãos.
Sou uma especialista em irmãos e até estou a pensar em destacar esta licenciatura, não, este verdadeiro doutoramento, no meu CV. Aliás, se houver uma manifestação de Dia dos Irmãos, que se celebra a 31 de maio, procurem-me, porque lá estarei com um cartaz a dizer "Perita em Irmãos desde 1960". Apresento desde já os meus créditos: sete irmãos, quatro rapazes e três raparigas, seis mais velhos e um mais novo, mãe de três irmãos, avó de sete. Tudo comprovável.
A sério, cá para mim, os empregadores inteligentes deviam valorizar o facto de um candidato ter irmãos, porque pressupõe competências que ficam para a vida e podem fazer toda a diferença numa empresa. Na prática, aquele candidato traz consigo anos de experiência numa PME, onde objetivamente exerce desde que nasceu.
Querem maior perito na arte de negociar do que quem cresceu num quarto com mais irmãos, na posse de um único armário? Aposto cem contra um, que sabe delimitar e defender o seu território, mas com a consciência plena de que para isso precisa de estabelecer alianças, ceder às vezes, para conquistar noutras. Quem recorda o prazer de levar a melhor camisola da irmã a uma festa de adolescentes não esquece as estratégias utilizadas para o conseguir. Nem a gratidão. Nem, claro, o que foi obrigado a dar em troca.
Os irmãos também aprendem a esperar desde sempre, que remédio! e a resistir à frustração. Nada acontecia logo, nem porque sim. O que, na prática, torna-os especialistas a não desperdiçarem oportunidades: um sétimo filho tem consciência de que o tempo do chefe é precioso (como era o dos seus pais) e que, se não sintetizar o que lhe quer dizer, é bem provável que alguém o interrompa antes de chegar ao fim. E, evidentemente, não o deixe começar a lengalenga do princípio.
Além do mais, ao contratar um "irmão", uma empresa poupa logo à partida em ações de formação em liderança, workshops em cooperação ou team building destinado a ensinar a trabalhar em equipa. Idem aspas para todas aquelas conversas do vestir a camisola, lealdade ao grupo e coisa e tal. O candidato ao emprego já traz esses "créditos" e "pontos" e mais alguns, com a vantagem de lhe somarem anos de aplicação prática.
Mas a candidata que, além de apresentar irmãos, revela a mais--valia curricular de ser igualmente mãe de vários filhos, devia obviamente ficar com o lugar, com promoção imediata a chefe de qualquer coisa. A resiliência que demonstra será incomparável, porque o que espanta mais na história de Caim e Abel, é como Eva resistiu a estrangular os dois, antes mesmo do desenlace fatal. Quem em casa aprendeu a resolver, ou pelo menos a sobreviver, aquelas discussões sobre quem é que põe a loiça na máquina, se senta à direita ou à esquerda, e os ciúmes que redundam na acusação de favorecimento indevido, está pronto para gerir os recursos humanos de uma multinacional.
Porque uma mãe de irmãos sabe, por exemplo, que ignorar os conflitos, deixando que se arrastem, como tantas vezes acontece nos locais de trabalho, é meio caminho andado para entropias sem fim. Sabe, enquanto uma de vários irmãos, que as relações humanas só se tornam sólidas e saudáveis quando somos tratados com justiça e equidade. Decididamente, ter irmãos devia contar!
Nota: Mesmo os Especialistas em Irmãos continuam a ter muito que aprender. Escrevi com entusiasmo o prefácio do livro Para de chatear a tua irmã, e deixa o teu irmão em paz, da Magda Dias (editora Manuscrito), acabado de publicar, porque aprendi muito com ele. Há sempre lugar para um pós-doc.
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