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CRÓNICAS E ENTREVISTAS
OS (MILHÕES DE) SEGUIDORES DE LUCÍLIA
Publicado em: 18/09/2024
Na semana passada fomos generosamente presenteados com duas pérolas mediáticas de primeira categoria: a conquista da liberdade por cinco cadastrados de peso e a simpática conversa da Procuradora Geral da República com os nossos queridos representantes eleitos.
Os ensinamentos que absorvi desta última são também de primeira apanha. Para além de nos ter explicado que uma parte do problema da Justiça reside na tontice de se terem desatado a contratar mulheres – dando razão à minha avó que insistia que o papel das mães era o de cuidar da casa e criar os filhos –, desconstruiu a narrativa perversa de que havia escutas telefónicas em barda e colocadas à balda.
Nada disso. Afinal não passaram de uns míseros 10.500 cidadãos, o que não representam mais que uns ridículos 1,5% dos processos instaurados no ano passado, ou seja, amendoins. E ainda por cima, garantiu, eram já muito menos do que nos anos anteriores. E por causa desta ninharia andava para aí meio mundo histérico com medo que lhes apanhassem as combinações do fim-de-semana com as amantes, ou o pedido para o mecânico não lhes passar faturas do arranjo do carro. Uns exagerados, alarmistas e mal-intencionados.
A verdade é que depois de pensar um bocadinho (coisa que não costuma dar grande resultado) descortinei que cada um dos escutados fala com outras pessoas que, naturalmente, passam também a ser escutadas. Vai daí agarrei no meu telemóvel e fui ver com quantas pessoas diferentes é que no último mês falei ou troquei mensagens e alarguei a mesma análise à família mais próxima, para concluir que, em média, cada um de nós falou ou contactou com 75 pessoas a cada trinta dias. O que não faço ideia, nem a senhora doutora Lucília Gago nos disse, é qual é o tempo médio em que cada suspeito fica sob escuta, mas atendendo aos poucos casos conhecidos diria que é muito mais que isso. Sem que aparentemente possam, no entanto, competir com o Dr. Galamba, recordista nacional com quatro anos de convívio intenso com os seus dedicados escutadores.
Mas pronto, penso que todos aceitaremos como razoável um valor médio de 100 pessoas por cada escutado, que passam também a integrar o universo de potenciais atuais ou futuros visados. Ou seja, num ano, temos um milhão de portugueses nesta rede, o que já não é nada mau. Mas tendo em conta que nos anos anteriores eram muito mais, então diria que é ínfima a probabilidade de encontrar um cidadão que não tenha sido envolvido numa escuta determinada pelos subordinados da senhora Procuradora.
Ora isto suscita-me, de imediato, duas reflexões.
Em primeiro lugar, o facto dos abnegados escutadores serem votados ao anonimato, sem que ninguém tenha a oportunidade de os congratular pela sua dedicação à causa pública. Faço ideia do insuportável sofrimento que é ter de ouvir intermináveis conversas, que versam assuntos tão relevantes como o que preparar para o jantar, as gracinhas dos filhos, ou os desabafos de treinadores de bancada a acusarem o árbitro de ter prejudicado a sua equipa, e sem que reclamarem por um subsídio de risco, numa profissão de óbvio desgaste rápido e que seguramente conduzirá muitos deles à depressão, ou pior.
A segunda reflexão prende-se com o enorme potencial económico que está aqui a ser desbaratado, impedindo que se encham os cofres de forma limpa e segura, revertendo os fundos para contratar um investigador para cada cidadão. Os contactos de telemóvel destes milhões de portugueses valem ouro, mas mais importante do que isso não seria preciso um Mark Zuckerberg para os transformar em seguidores da PGR e da sua líder, no encalço de Taylor Swift. Então sim, podiam fazer frente à tenebrosa “campanha orquestrada contra o Ministério Público”, de que tanto se queixam.
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